Pesquisadores descobrem possível nova espécie de macaco no Pantanal de MS
Cores da pelagem dos primatas indicam uma espécie em Corumbá ainda não descrita pela ciência; caso está em estudo

A coloração variada da pelagem, as orelhas esbranquiçadas e a cauda cinza, bem como o rosto com coloração marrom. Esses são alguns dos detalhes que pesquisadores utilizaram para identificar que uma das espécies de primata que ocorre em Corumbá não é aquela atualmente determinada pela ciência.
Em levantamento que vem sendo feito no Pantanal desde 2010 dentro do município de Corumbá, com avanços maiores ano passado, um grupo formado por 10 pesquisadores, metade deles de Mato Grosso do Sul, indica que o primata difere substancialmente daquele que as publicações científicas reportavam como ocorrente na região.
A existência de uma possível nova espécie gera alertas que a envolvem necessidade de preservação de habitats e o uso adequado do fogo no bioma.
O resultado dessa pesquisa foi relatado em artigo publicado na última edição do periódico científico Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, um dos mais antigos do Brasil, veiculado em dezembro de 2022.
O trabalho intitulado “Primatas ocorrentes na Bacia do Alto Paraguai e Pantanal, Brasil” buscou mapear as espécies de macacos presentes na região.
Em todo o Brasil, existem 127 espécies de primatas descritas até hoje, oito delas identificadas na Bacia do Alto Paraguai. Conforme os cientistas, cinco desses macacos estão na planície pantaneira. A partir desse estudo regional, uma nova espécie poderá ser inserida nessa lista.
Os pesquisadores identificaram essa possível nova espécie apenas com o nome científico de Plecturocebus sp., já que ainda não há descrição publicada com base em estudos genéticos.
Com o nome popular de boca d’água, como é conhecido na região, ele pode ser enquadrado como zogue-zogue, por pertencer à mesma família. Os registros de campo, incluindo dezenas de fotografias, permitiram definir que esses macacos ocorrem tanto na Serra do Amolar quanto no Maciço do Urucum e arredores.
O Maciço do Urucum é uma área com exploração de minério de ferro e fica a cerca de 30 km da cidade de Corumbá, enquanto a Serra do Amolar está em território de maior preservação do Pantanal, com a presença de Reservas Particulares de Proteção Nacional (RPPNs).
Em 2020, essa área foi fortemente atingida pelos incêndios florestais, mas o fogo impactou menos a região em 2021 e 2022, depois de ações de prevenção.
“Os indivíduos de Plecturocebus sp. registrados na região do Maciço do Urucum, em Corumbá, bem como na Serra do Amolar, mais ao norte, não correspondem à descrição de van Roosmalen (2002, primatólogo referência mundial), situação esta já reportada em 2010, 2012 e 2017”, descrevem os pesquisadores no artigo científico, que teve como principal autor Walfrido Moraes Tomas, doutor em Ecologia e Conservação, além de pesquisador da Embrapa Pantanal desde 1990.
“Chama atenção o fato que, na borda oeste do Pantanal brasileiro, na fronteira com a Bolívia (única área de ocorrência da espécie no Brasil), a coloração da pelagem é mais congruente com certas caraterísticas de P. donacophilus”, completa o artigo.
Ainda houve a identificação que o macho e a fêmea apresentam diferenças na coloração do pelo, o que é chamado de dicromatismo sexual.
Esse fator representou outro diferencial da possível nova espécie localizada no Pantanal, já que é um caso aparentemente único nessa família de primatas.
As fotos utilizadas para comparações no artigo científico publicado em dezembro foram obtidas anos atrás, na fazenda Santa Teresa (um macho), que fica na Serra do Amolar, bem como no Maciço do Urucum (uma fêmea), área com maior interferência humana e próximo da área urbana de Corumbá e das áreas de mineração.
“Esta descrição [das espécies de primatas já relatadas na ciência] não corresponde à presente na revisão do gênero apresentada por van Roosmalen (em 2002) para P. pallescens e nem para P. donacophilus. Por este motivo, adotamos o nome científico genérico Plecturocebus sp. para a espécie ocorrente na região”, detalham os pesquisadores.
“Adicionalmente, as evidências indicam um dicromatismo sexual para os indivíduos dessas populações localizadas na borda oeste da planície do Pantanal”, completam.
Etapas
A consolidação de que se trata de uma nova espécie agora passa por novas etapas científicas de estudos taxonômicos, principalmente, baseados em estudos genéticos.
Nesse ramo da biologia, é preciso aprofundamento que permita descrever, identificar e nomear seres vivos, envolvendo diferentes aspectos genéticos, reprodutivos e fisiológicos, por exemplo. Com isso, são definidas categorias como reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie.
Preservação
A pesquisa sobre os primatas na Bacia do Alto Paraguai, que envolveu os pesquisadores Walfrido Moraes Tomas, Thiago Philipe de Camargo Timo, André Restel Camilo, Maxwell da Rosa Oliveira, Fernando Rodrigo Tortato, Simone Mamede, Maristela Benites, Carolina Martins Garcia, Almério Câmara Gusmão e José Rímoli, identificou que, das oito espécies de primatas encontradas, uma é considerada ameaçada (macaco-aranha-de-cara-preta) e outra vulnerável, conforme os critérios da lista vermelha da International Union for Conservation of Nature (IUCN).
“A principal ameaça à conservação dos primatas que ocorrem na BAP [Bacia do Alto Paraguai], nas áreas mais altas que circundam o Pantanal, é a perda e a fragmentação de habitats. No Pantanal, onde mais de 80% das paisagens estão conservadas, a perda de habitat e a fragmentação ainda não são uma ameaça premente às espécies”, explicam.
“No entanto, os grandes incêndios que têm atingido o bioma nos últimos anos, causando mortalidade direta sobre a fauna e degradando os ambientes florestais, podem ser uma ameaça”, afirmam os pesquisadores.
No ano passado, uma lista propositiva de espécies ameaçadas de extinção foi entregue ao governo do Estado, para que fosse definida uma estratégia para sua avaliação e validação por especialistas, servindo de base para alertas sobre espécies que aparecem como ameaçadas regionalmente.
Essa proposta segue sob análise e sua adoção pelo Estado servirá de base para tomadas de decisão em políticas públicas.
A possível nova espécie é identificada com o nome científico de Plecturocebus sp., já que ainda não tem descrição publicada com base em estudos genéticos. Os registros de campo, incluindo dezenas de fotografias, permitiu definir que esses macacos ocorrem tanto na Serra do Amolar quanto no Maciço do Urucum e arredores.
Fonte/Créditos: Correio do Estado